CARBOIDRATOS na DIETA: frutose, IG e sensibilidade à insulina (DUDU)

Tempo estimado de leitura: 8 minutos

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Quando de fala do uso de carboidratos na dieta logo aparecem uma série de suposições e noções equivocadas sobre os mesmos. Algumas tão conhecidas e divulgadas que muitas pessoas acreditam piamente serem irrefutáveis, até porque essas pessoas acreditam que seus resultados são devidos a esses princípios, que na verdade não tem nenhum embasamento científico. Comer carboidratos à noite, uso frutose na dieta, uso de alimentos de alto índice glicêmico, são alguns desses conceitos que são entendidos de forma equivocada, quase sempre por ignorar o contexto da dieta.

Comer carboidratos à noite não vai fazer você acumular gordura, você vai ganhar gordura se fizer uma dieta com excesso de calorias, muito acima do seu gasto calórico [1]. O horário que você come seus carboidratos pouca diferença faz, pois a variação da taxa metabólica não muda muito do dia para noite. Inclusive para quem realiza seu treinamento durante à noite, o ideal é consumir refeições ricas em carboidratos antes e após o treino. O consumo de carboidratos antes de dormir também não vai interferir na liberação de hormônio do crescimento. Níveis de pico de GH ocorrem 1 a 4 horas após o início do sono (durante os estágios 3 e 4). A infusão de glicose não suprime essa liberação episódica. A liberação do hormônio do crescimento durante o sono é irregular e intermitente, e ocorre quando a glicose plasmática não é flutuante e depois de insulina caiu para um nível muito baixo. Portanto comer carboidratos antes de dormir não vai atrapalhar a liberação de GH [2].

Agora, quando se fala em ganho de gordura com carboidratos, a ênfase é sempre dada ao índice glicêmico (IG), a presença de frutose na dieta, e aos elevados níveis de insulina na presença de uma dieta rica em carboidratos. Muitos fisiculturistas, alguns nutricionistas e treinadores, acabam extrapolando o uso desses conceitos de forma equivocada para qualquer contexto nutricional e de treinamento.



Alimentos de alto IG elevam a glicemia e consequentemente a secreção de insulina, no entanto atribui-se ao IG de 49% a 79% da variabilidade da resposta insulinêmica pós-prandial. Sendo assim, a utilização do índice glicêmico como preditor da insulinemia requer cautela [3]. Além do IG é importante considerar a quantidade de alimento no impacto da glicemia pós-prandial, que é considerado pelo conceito de carga glicêmica (CG), que representa o produto do IG do alimento e do seu conteúdo de carboidrato:

CG = (IG x quantidade de carboidrato) / 100

Assim, um alimento como a melancia, que tem um alto IG (72), tem uma baixa CG, pelo baixo conteúdo de carboidratos na porção. Logo a resposta insulinêmica da pela CG é mais relevante que o conceito de IG, quando se avalia um alimento isoladamente.

Mas qual o impacto do índice glicêmico em uma dieta? Uma avaliação exaustiva de ensaios de intervenção humanos não encontrou nenhuma diferença significativa na perda de peso média entre dietas de baixo e alto índice glicêmico. Em conclusão, o atual corpo de evidências de pesquisa não indica que alimentos com baixo IG são superiores aos alimentos com alto IG em relação ao tratamento da obesidade. Alguns alimentos com alto IG (como a melancia, batata inglesa) também possuem baixa carga glicêmica (o que remete a uma menor resposta à insulina), enquanto alguns alimentos de baixo IG (leite, feijão cozido, iogurte) elevam a resposta à insulina. Co-ingestão de proteínas e gorduras pode tanto baixar o IG da refeição, como, potencializar a resposta à insulina, dependendo também da combinação e modo de preparo da refeição [4]. De qualquer forma, não podemos ignorar que em uma dieta para ganho de peso, o IG dos alimentos pode ser relevante, principalmente quando consideremos o saldo calórico total e a resposta à insulina individual (sensibilidade/resistência à insulina). Além do que a escolha dos alimentos em relação ao IG pode ter impactos diferentes na saúde, principalmente de diabéticos.



Antes de continuar falando sobre a importância do conceito de sensibilidade à insulina, vou explorar um outro assunto polêmico quando se fala em carboidratos, o consumo de frutose e seu impacto na dieta. “A absorção da frutose aumenta quando ela é ingerida sob a forma de sacarose ou quando misturada com a glicose. A frutose é primariamente metabolizada no fígado, apesar de o intestino e os rins possuírem enzimas necessárias para o seu catabolismo. Sua rápida entrada no hepatócito é mediada também pela GLUT 2, não havendo gasto de energia ou necessidade do estímulo pela insulina. Estudos em animais e em seres humanos demostraram aumento nos triglicerídios após a ingestão de dietas contendo frutose quando comparadas às dietas com carboidratos mais complexos e outros açúcares. Há aumento da síntese de gordura em detrimento da gliconeogênese, e esse aumento ocorre pela maior síntese hepática de glicerol e de ácidos graxos, 1,4 a 18,9 vezes, quando comparamos com a glicose. O aumento da atividade das enzimas lipogênicas no fígado resulta em maior síntese de lipídios, e, como conseqüência, níveis mais elevados de lipídios totais na circulação e de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL)” [5].

Agora é importante deixar claro que para que a frutose, principalmente oriunda do xarope de milho e dos carboidratos refinados (açúcar = sacarose = 50% glicose e 50% frutose), contribua significativamente para a síntese de lipídios e hipertrigliceridemia, é preciso considerar um saldo calórico positivo, maior consumo de gorduras (efeito sinérgico com frutose), um elevado consumo de frutose (> 50-100g por dia) [6], e/ou algum fator de risco relacionado a idade ou genética (mulheres pós-menopausa, homens hiperinsulinêmicos e diabéticos tipo 2) [5]. Então, no contexto de atletas, pessoas mais sensíveis à insulina, e/ou também em uma dieta hipocalórica, low carb, o consumo de frutose, mesmo acima de 50-100g por dia, dificilmente trará algum malefício à saúde do indivíduo, muito menos ganho de gordura.

Muitas pessoas também costumam achar que as frutas podem aumentar o ganho de gordura pelo seu teor de frutose. Basta um pouco de pesquisa para saber que grande parte das frutas tem uma quantidade muito pequena de frutose (morango, abacaxi, melão, melancia, etc), além de muitas delas serem pouco calóricas e de baixa carga glicêmica. E a pouca frutose nesse caso é uma vantagem em uma dieta low carb, já que a frutose não estimula a liberação de insulina. Para a frutose ser prejudicial é preciso que seja ingerida uma grande quantidade, e isso não significa comer muitas frutas e sim abusar de alimentos industrializados, ricos em açúcar de mesa (sacarose= 50% frutose e 50% glicose), ou mel e xarope de milho, além das condições citadas anteriormente.



Voltando finalmente ao conceito de sensibilidade à insulina, dos que considero entre os mais importantes para compreensão do impacto da dieta no metabolismo, tanto em relação à aspectos de saúde (diabetes tipo 2, obesidade, síndrome metabólica), como também para a performance no fisiculturismo, uma vez que o ganho de massa muscular e a perda de gordura são fortemente dependentes da resposta do individuo ao consumo de carboidratos. A sensibilidade à insulina se refere ao quão bem nosso corpo responde ao hormônio insulina, e uma boa resposta significa uma menor secreção do hormônio para cumprir suas funções. Os indivíduos que são resistentes à insulina tendem a ter níveis mais elevados de insulina basal, porque o corpo está liberando mais em resposta a tentar vencer a resistência (obesos, diabéticos tipo 2, mulheres com síndrome de ovários policísticos). No mesmo nível de gordura corporal, a sensibilidade à insulina pode variar quase 10 vezes por razões genéticas [7]. Isso faz com que diferentes indivíduos respondam de forma diferenciada a dietas de acordo com sua composição de macronutrientes, principalmente carboidratos. Uma boa sensibilidade á insulina se reflete em níveis menores que 3 uU/ml em jejum, ou menores que 4 uU/ml, se a glicemia é baixa (Paulo Muzy) [8]. Uma forma prática de detectar sinais para saber se você é sensível ou resistente à insulina é observar sua resposta a uma elevada ingestão de carboidratos [7]. Um indivíduo sensível à insulina se sente com músculos cheios e bombeados após uma refeição rica em carboidratos, e com com níveis de energia estáveis, e seu percentual de gordura tende a ser estável e baixo mesmo em uma dieta rica em carboidratos. O indivíduo mais resistente á insulina se sente inchado, retido, pode ficar sonolento e com fome após uma refeição rica em carboidratos, e seu percentual de gordura tende a se elevar facilmente quando aumenta a ingestão de carboidratos na dieta.

Como podemos perceber o uso de alguns conceitos da nutrição de forma isolada, ignorando o contexto nutricional, hábitos do indivíduo, seu metabolismo e genética, podem levar a uma série de equívocos na aplicação da prescrição nutricional. O IG dos alimentos e o controle da frutose na dieta sem dúvida nenhuma devem ser considerados, mas é preciso contextualizar a forma com que faz uso disso. Existe muito extremismo, apenas por uma simplificação estúpida de como as coisas realmente funcionam. Profissionais e atletas experientes muitas vezes seguem muitas das ideias que falei aqui de forma intuitiva, em parte devido a grande experiência prática, mas são realmente poucos que entendem como as pessoas podem responder de forma tão diferente a diferentes estratégias nutricionais. O conceito de sensibilidade á insulina aqui mostra uma grande importância, que vai além de sua aplicabilidade na área de saúde, patologias, mas mostra também que possui um grande impacto em como as pessoas podem melhorar, aperfeiçoar, seu físico no cotexto do fisiculturismo e do fitness. Isso está fortemente relacionado aos aos conceitos de “abismo metabólico” e “potencial genético”, abordado em artigos anteriores.

abraços, dudu haluch

[1] Carboidratos Durante A Noite: Escrito Por Layne Norton.

[2] Changing concepts on the control of growth hormone secretion in man.
W. P. VanderLaan; Calif Med. Aug 1971; 115(2): 38–46.



[3] Nutrigenética e Implicações na Saúde Humana; Dal Bosco & Genro.

[4] Elements Challenging the Glycemic Index (Alan Aragon)

No difference in body weight decrease between a low-glycemic-index and a high-glycemic-index diet but reduced LDL cholesterol after 10-wk ad libitum intake of the low-glycemic-index diet.
Sloth B, Krog-Mikkelsen I, Flint A, Tetens I, Björck I, Vinoy S, Elmståhl H, Astrup A, Lang V, Raben A.

Raatz SK, et al. Reduced glycemic index and glycemic load diets do not increase the effects of energy restriction on weight loss and insulin sensitivity in obese men and women. J Nutr. 2005 Oct;135(10):2387-91.

Raben A. Should obese patients be counselled to follow a low-glycaemic index diet? No. Obes Rev. 2002 Nov;3(4):245-56.



[5] Frutose em humanos: efeitos metabólicos, utilização clínica e erros inatos associados. Rodrigo Crespo Barreiros, Grasiela Bossolan, Cleide Enoir Petean Trindade.
Rev. Nutr. vol.18 no.3 Campinas May/June 2005

[6] The bitter truth about fructose alarmism, Alan Aragon.

Livesey G, Taylor R. Fructose consumption and consequences for glycation, plasma triacylglycerol, and body weight: meta-analyses and meta-regression models of intervention studies. Am J Clin Nutr. 2008 Nov;88(5):1419-37.

[7] Insulin Sensitivity and Fat Loss, Lyle McDonald.

[8] Notas de aula, curso do Paulo Muzy.
SUPLEMENTAÇÃO DE CARBOIDRATOS E EFICIÊNCIA METABÓLICA (DUDU)






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