sim? não? tanto faz?
Muito se tem discutido sobre a eficácia do exercício aeróbico em jejum (AEJ), atividade muito difundida entre fisiculturistas para otimizar a queima de gordura. Nesse artigo pretendo esclarecer alguns equívocos sobre esse debate, com base em estudos.
A ideia básica por trás do AEJ é que o corpo utilizaria mais gordura em jejum, pelo fato de as reservas de carboidratos estarem baixas. Os estudos não parecem suportar tal ideia.
“A equipe de Coyle mostrou repetidamente que a ingestão de carboidratos durante a moderada intensidade (65-75% VO2 max) não reduz a oxidação de gordura durante o primeiro 120 min de exercício em homens treinados [1]. Curiosamente, a margem de intensidade proximal ao local onde a oxidação de gordura é mais alto não foi afetada pela ingestão de carboidratos, e assim permaneceu durante as primeiras 2 horas de exercício.
Equipe Horowitz ‘examinou o efeito durante o treinamento de uma solução de carboidratos com alto índice glicêmico em homens moderadamente treinados submetidos a um ou outro exercício de baixa intensidade (25% VO2 max) ou de intensidade moderada-alta (68% VO2 max) [2]. Resultados semelhantes ao trabalho de Coyle foram vistos. Os resultados indicaram que, apesar da supressão da lipólise após a ingestão de carboidratos durante o exercício, a taxa lipolítica permaneceu elevada e, portanto, não limitou a oxidação de gordura [3].”
Paoli e colaboradores recentemente também mostraram que quando exercícios de resistência moderada é feito para perder gordura corporal, o jejum antes do exercício não aumenta a utilização de lípidos [4].
Por outro lado também, estudos mostram que se alimentar antes do exercício eleva o metabolismo. Aparentemente, o exercício amplia o efeito térmico do alimento (ETA), ou também chamado de termogênese induzida pela dieta (TID), que nada mais é que a energia necessária para digerir, absorver e assimilar os nutrientes alimentares (por exemplo, uma refeição de proteína pura induz um efeito térmico de quase 25% do valor calórico total da refeição). Desse modo parece mais sensato encorajar o exercício moderado após o estado alimentado, e não ao jejum [5].
Isso não significa que sou contra o exercício aeróbico em jejum, muito menos que AEJ não funciona. Na verdade, acredito que possa existir uma certa vantagem metabólica de se fazer AEJ para indivíduos experientes treinados, principalmente se o treinamento de hipertrofia é realizado no final da tarde ou de noite, de forma a manter o metabolismo elevado por mais tempo. Mas acima de tudo sou um defensor de que esse exercício seja realizado em uma intensidade moderada-alta, para otimizar o seu metabolismo de forma mais eficiente, estimulando hormônios lipolíticos (que favorecem a queima de gordura) como as catecolaminas, o GH, e mesmo o cortisol, além de melhorar a sensibilidade à insulina, estimular a biogênese mitocondrial (aumento no tamanho e no número de mitocôndrias) e manter a EPOC (consumo excessivo de oxigênio pós-exercício), aumentando sua taxa metabólica no período pós-exercício. Maior oxidação de lipídios (queima de gordura) ocorre com intensidades de exercício por volta de 65% da VO2máx (consumo máximo de oxigênio) ou 75% da FCmáx (FCmáx = 220 – idade, frequência cardíaca máxima) [6].
Muitas pessoas tem uma preocupação com o cortisol, por ser um hormônio catabólico e seus níveis em jejum estarem elevados e procuram suplementar com aminoácidos da cadeia ramificada (BCAAS) antes do aeróbico em jejum e até mesmo durante a atividade física por acreditarem que estarão perdendo muita massa muscular. A verdade é que um corpo sadio utiliza pouca proteína durante a atividade física, não mais que 5-10% da energia total consumida [6, 7], e se o indivíduo estiver usando hormônios anabólicos (esteroides androgênicos) essa contribuição deve ser insignificante, já que androgênios bloqueiam a ação do cortisol. O aumento da insulina antes e durante a atividade física pode inibir a lipólise. O uso de aminoácidos, como a leucina, também estimulam a liberação de insulina [5], portanto o uso de suplementos como BCAAS durante o exercício pode diminuir a lipólise, mas como vimos anteriormente isso não parece influenciar na oxidação de gorduras [1-4]. O catabolismo como um processo crônico de perda de massa muscular em indivíduos treinados não acontece de um dia para o outro. As condições para que isso aconteça envolvem destreinamento, por um período maior que ~2 semanas, má alimentação com déficit calórico por dias prolongados, e principalmente uma alteração agressiva no perfil hormonal, como é o caso de indivíduos que fazem uso de esteroides androgênicos [8].
Sobre os argumentos que dizem que AEJ pode ser perigoso, nem vou perder meu tempo, seria o mesmo que me preocupar em catabolizar ou passar mal por fazer sexo antes do café da manhã, e nada mais natural para um casal apaixonado (mesmo sedentários) fazer sexo de manhã sem se preocupar com catabolismo ou controlar a intensidade para não passar mal, lol. AEJ pode não ser mais eficiente, e nem uma estratégia de cardio indicada para os novatos, mas acredito que para indivíduos experientes não deixa de ser uma boa ideia, mesmo que de eficácia duvidosa, já que os estudos não mostram que é uma estratégia menos eficaz, apenas que comer ou ficar em jejum tende a ser irrelevante no resultado final. Enfim, se você não consegue fazer aeróbico em intensidade moderada-alta em jejum, prefira fazer após se alimentar, será muito mais eficaz do que um aeróbico em intensidade baixa.
abraços, Dudu Haluch
[1] Coyle, et al. Muscle glycogen utilization during prolonged strenuous exercise when fed carbohydrate. J. Appl. Physiol. 1986;6:165-172.
Coyle, et al.. Carbohydrates during prolonged strenuous exercise can delay fatigue. J. Appl. Physiol. 59: 429-433, 1983.
[2] Myths Under The Microscope Part 2: False Hopes for Fasted Cardio
By Alan Aragon © 2006
[3] Substrate metabolism when subjects are fed carbohydrate during exercise. Horowitz JF et al.. Am J Physiol. 1999 May;276(5 Pt 1):E828-35.
[4] Exercising fasting or fed to enhance fat loss? Influence of food intake on respiratory ratio and excess postexercise oxygen consumption after a bout of endurance training. Paoli A, Marcolin G, Zonin F, Neri M, Sivieri A, Pacelli QF. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2011 Feb;21(1):48-54.
[5] Fisiologia do Exercício, McArdle, 7ª edição.
[6] Exercício, emagrecimento e intensidade do treinamento, Aspectos fisiológicos e metodológicos; Carnevali Jr., Lima, Zanuto & Lorenzeti, 2ª edição.
Exercício Aeróbico e METABOLISMO (AEJ, EPOC, HIIT e Hormônios) DUDU
[7] Fisiologia do Esporte e do Exercício, 5ª edição.
[8] CATABOLISMO: destreinamento, nutrição e ambiente hormonal (DUDU)